O distintivo “escudinho”


Alexandre Martins, cm.

Com a redescoberta das Congregações Marianas pela juventude do século XXI, várias peculiaridades características foram também redescobertas e se tornaram objeto de discórdia ou espanto, por incrível que possa parecer.
As Congregações Marianas em todo o Mundo começaram a adotar um sinal que fizesse os Congregados marianos serem destacados no cotidiano da Sociedade. Como os antigos cavaleiros templários, que ostentavam a Cruz de Cristo em suas vestes diárias, os Congregados marianos inventaram o uso de um distintivo próprio para o uso diário.
Não bastava o uso da medalha nas cerimônias litúrgicas. Sentia-se nos corações uma necessidade de mostrar a todo o Mundo, a todas as pessoas, o orgulho em ser um filho predileto da Virgem Maria.
Pois esse é o motivo principal do uso do distintivo: o orgulho de ser um Filho de Maria e propagar essa especial devoção a toda a hora, em toda a ocasião.
No fervor do início do século XX, as Congregações Marianas se propagavam devido a vários motivos. E, como um exército de Maria, sentia-se a natural necessidade de cada vez maior organização.
Como mostrar ao Mundo as Congregações Marianas através de apenas um símbolo? Era a época da suástica do Nazismo, da foice e martelo do Comunismo, do sigma dos Integralistas... As Congregações Marianas não podiam se clara.
 
 
o distintivo brasileiro até 1955
 
O distintivo brasileiro1 surgiu no Rio de Janeiro (RJ) na década de 1920 por desenho de um congregado mariano carioca. Como os Congregados marianos são soldados de Maria Rainha, também são cavaleiros Dela. Nada mais natural que o formato fosse de um escudo medieval. Foi encimado por três pontas, simbolizando as três Virtudes Cardeais. Do formato originou seu apelido pelos cariocas: o “escudinho”.
A cor principal deveria ser o azul, como é evidente. Mas seria um azul mais “masculino”, dado que a maioria esmagadora das Congregações Marianas da época era composta por homens. Optou-se pelo azul ciano, um azul mais escuro que o azul litúrgico de Maria, este mais claro. Sobre ele, uma cruz latina na cor branca, símbolo da pureza de Maria e também a pureza do Congregado mariano.
A coroa dourada é um dos símbolos mariais, representando a realeza sagrada de Maria.
Abaixo as iniciais “A” e “M”, de “Ave Maria”, a saudação angélica proferida à Virgem (Lc2,16). Era um monograma comum na época e usado desde há muito tempo atrás.
Rapidamente as Congregações Marianas de todo o Brasil utilizaram essa nova marca que, pela primeira vez na História. Marcava a ação das associações criadas pelos Jesuítas. Selos, cartas,m timbres, e todo o material impresso das Congregações Marianas bem como a parede das sedes, era visto o distintivo. No Manual dos Congregados ensinava-se a prática de se pronunciar “Salve, Maria” quando o Congregado o colocava na lapela pela manhã ao vestir-se.
Não tardou para que fosse confeccionado um distintivo de lapela. Era uma época em que o padrão austero e inglês de moda masculina era o paletó cinza ou preto, o uso de qualquer adereço chamava a atenção. Seria como o uso cotidiano de camisas de futebol hoje em dia. Isso é uma prova de que “sentir vergonha” não era hábito entre os Congregados mariano brasileiros.
Haviam de vários tamanhos e modelos, como os de paletó (com alfinete comprido) os de camisa (como broche) mas todos folheados a ouro.
Foi realmente o símbolo das Congregações Marianas do Brasil pois constava da bandeira oficial e era estampado na capa das edições do Manual dos Congregados.
Em 1953 fundou-se em Roma a Federação Mundial das Congregações Marianas. O próprio Papa Pio XII foi o elemento incentivador dessa instituição. Desdobramento natural do Congresso Internacional do Apostolado Leigo, aonde se percebeu que as Congregações Marianas não tinham um órgão internacional que as pudesse representar.
Como toda a instituição, há a necessidade de um símbolo, uma marca. E, para a surpresa de todos os Congregados do Mundo foi escolhida uma marca que havia sido criada décadas atrás na Alemanha. O monograma “Chi-ro” aconteceu por ocasião de um Encontro de Congregações Marianas na Alemanha2 da década de 1920 - pré-Nazismo - onde foi usado pela primeira vez nas bandeiras das Congregações participantes.
Era o desdobramento de uma marca milenar usada pelos cristãos e pela Igreja desde os tempos das catacumbas de Roma.
A primeira Congregação Mariana foi também a primeira a adotar o novo distintivo. As demais Congregações Marianas do Mundo seguiram seu exemplo. Nem se pode dizer “novo distintivo” pois somente o Brasil era constante no uso de um símbolo para suas Congregações Marianas além da medalha da Congregação.
No Primeiro Congresso Mundial das Congregações Marianas em 1954 decretou-se3 que as Congregações Marianas adotariam o que foi o símbolo deste Congresso, utilizado somente pela Alemanha - de onde saiu a criação do monograma - e de mais 8 países, incluso a Itália. Como as Congregações brasileiras eram “afinadas” a acompanhar o proposto por Roma, usou-se o distintivo atual que também era o usado pela Congregação Mariana “Prima-Primária”. Logo após o Congresso Eucarístico Nacional realizado em 1955 no Rio de Janeiro (RJ) a CNCMB resolve, após reunião com representantes de todo o Brasil adotar o “distintivo da Prima Primária”.
A empolgação era grande: estávamos “antenados" com o Mundo Católico!
Este monograma significa as duas primeiras letras - X e P - do nome de Cristo em grego ( χριστος = “Kristós” = ungido). A letra “M” é de Maria. Portanto, significa simbolicamente “a Cristo por Maria”. A cor Azul é a cor de Maria. A cor dourada a de Cristo Sacerdote. O hexágono é a representação da criação, pois o número seis tem este significado - o Mundo foi criado em seis dias - simbolizando4 que devemos criar algo a partir da Congregação, como nosso apostolado.
O monograma (X-P, ou Chi-rota) é de uso antiquíssimo, sendo mesmo encontrado em objetos litúrgicos nas Catacumbas de Santa Priscila, em Roma, datadas do século II. As letras I (ióta) e X (khi) são as iniciais gregas das palavras Khristos Iésous (Jesus Cristo). O símbolo aparece posteriormente5 no chamado “Crisma de Constantino”. Esta junção permanece até os dias de hoje na representação litúrgica.
O uso do hexágono foi de uso da Federação Mundial apenas para dar um formato agradável e coeso ao monograma. As cores azul e amarelo simbolizam Maria (azul) e a sacralidade (amarelo, cor do Sol, representação clássica da divindade, no caso de Cristo, Sol da Justiça). 
 
 
Entretanto, algumas Congregações Marianas - mais por ignorância do que por outra coisa -  não se preocuparam com isso e continuaram a usar a bandeira com o distintivo antigo. Mas, na época surgia também uma associação que haveria da usar o antigo símbolo das Congregações Marianas para mascarar seus reais propósitos: a Sociedade de Defesa da Tradição, Família e Propriedade – a TFP.
Criada por Plínio Corrêa de Oliveira - um antigo congregado da Federação de São Paulo (SP) - a TFP por décadas se mostraria como uma espécie de “mantenedora” de valores sociais e religiosos dos anos 1950. E o uso do antigo distintivo como seu símbolo no Brasil era porque os primeiros membros eram todos Congregados marianos paulistanos, assim como seu fundador. O símbolo oficial da entidade era um “leão rampante” heráldico, mas seus membros no Brasil usavam nas lapelas o antigo distintivo das Congregações Marianas. A intenção era simples e clara: como as Congregações Marianas sempre foram vistas como defensoras da Fé e propagadoras dos bons costumes cristãos, usando do distintivo mariano os membros da TFP queriam dar legitimidade a sua associação. Mas também era uma atitude de repúdio ao "moderno" Concílio Vaticano II, odiado pelos membros da TFP, bem como repúdio aos papas desde João XXIII.
A partir dos anos 1960, portanto, quem usasse o antigo distintivo era identificado como membro da TFP, pois todos os Congregados marianos adotaram o de Roma. 
A Confederação Nacional brasileira ainda criou em 2002 uma variação do distintivo composto somente do monograma para uso dos Congregados do Brasil. O que na realidade é um "retrocesso" ao usado no Congresso das Congregações Marianas alemãs de 1920. Não é novidade, posto que este já é usado por outras Congregações pelo Mundo como a de Medellin (Colômbia) e mesmo as Comunidades de Vida Cristã, ligadas aos jesuítas, se bem que mais estilizado.
No início do século XXI, as novas gerações de Congregados marianos, como relexo de seu tempo, iniciaram uma “Onda de nostalgia” e buscavam as experiências das Congregações Marianas do passado. O jovem católico dos anos 2000 estava decepcionado com uma atividade pastoral católica que para muitos assemelhava-se mais ao protestantismo. E ainda mais com a promulgação da Summorum Pontificum de Bento XVI, sentiram que estavam “legitimados” a buscarem o Antigo.
Nas Congregações Marianas o símbolo gráfico dessa “volta ao passado” foi o uso do antigo distintivo escudinho pelos jovens.
Mas, manter a tradição das Congregações Marianas – e, naturalmente, sua eficácia - não passa apenas pelos símbolos e exterioridades que as Congregações Marianas do Brasil sempre gostaram, mas em voltar as práticas interiores e o sentimento de honra que sempre permeou a vida do Congregado mariano.
Ser um cristão que tenha orgulho de ser um especial filho da Virgem Maria que aja tanto em sua vida espiritual quanto em seu cotidiano de forma reta, sincera, amorosa e pura é a real tradição. Isto é o interior do Congregado mariano que faz a diferença quando vemos o distintivo em sua roupa. Sem esse interior que transborda para o exterior não temos um soldado de infantaria mas um folião de carnaval usando uma roupa de soldado.
É por este motivo que alguns que usam a fita azul tem mais “presença” do que outros. As pessoas percebem isso quando os observam. Alguns sabem o que estão percebendo, outras não, mas todos sentem em seus corações que aquele Congregado mariano “é diferente”. É o interior que passa para o exterior.
O distintivo é um excelente meio de propaganda da Congregação. Atualmente todas as associações sérias usam alguma forma de símbolo. E as Congregações, seríssimas como são, não podiam deixar de possuir o seu. As grandes corporações empresariais japonesas6 insistem que seus funcionários usem os broches da empresa mesmo no ambiente diário: para elas, uma propaganda; para o funcionário, uma honra de participar de uma grande empresa.
Conta-se que um parlamentar congregado mariano7 comprou na Federação do Rio de Janeiro oito distintivos. Alguém estranhou a quantidade. Ele explicou: “É que vou viajar e levo oito ternos. Quero um distintivo em cada paletó para não ter de esquecer em casa ao mudar de terno”.
Existia no Brasil um lema8 muito difundido: “aonde o distintivo não possa estar, não pode o congregado estar”. Servia especialmente para os jovens que não queriam usá-lo em bailes um tanto vulgares. Se eles não gostariam de usar seu distintivo naqueles lugares duvidosos, quanto mais não deveriam permanecer neles.




recepção com uso do distintivo na Congregação Mariana de Bucaramanga (Colômbia) - 2013

Sempre se incentivou o Congregado mariano a usar o distintivo diariamente. Mas a grande maioria não usava, mesmo no tempo de muita atividade mariana. Isso não importa tanto. Repito: o interior promove o exterior. Se o Congregado mariano tem orgulho do que é e deseja mostrar esse amor aos demais para que eles também possam se beneficiar disso, então ele procurará formas de usar frequentemente o distintivo de acordo com a prudência e o bom senso. Usará o distintivo como uma forma de apostolado e não como uma ostentação preconceituosa ou simples enfeite.
E o distintivo diário continua sendo uma das melhores formas de ver a vida interior de cada Congregado mariano.
Salve, Maria!



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1- Antônio Maia, cm - palestra na Congregação Mariana “dos Capuchinhos”, Tijuca, Rio (RJ) 1995.
2- revista “Acies Ordinata”, 1954
3- Primeira Assembléia Mundial das Congregações Marianas, Roma, Itália, 1954 - conclusão 7
4- Schlesinger & Porto, Hugo & pe. Humberto - “Crenças, Seitas e Símbolos Religiosos”, Ed. Paulinas, S. Paulo (SP), 1983.
5- Lesage, cônego Robert - “Vestes e Objetos Litúrgicos” - Enciclopédia do Católico no Século XX (10ª parte) - tradução das Religiosas da Companhia da Virgem, Ed. Flamboyant, S. Paulo, (SP), 1960.
6- Martins, A - “Perguntas a um Congregado”, S. Gonçalo (RJ), 2005 - págs. 34 a 38
7- pe. Paulo J. de Souza, SJ, in “Vida Mariana”, pág. 37
8- ibid.”, pág. 37

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