Subindo e subindo


Alexandre Martins, cm.

        
A Congregação Mariana pode ser comparada a um alpinista que se aventura em uma nova montanha, desconhecida para ele.
Se estiver em caminho que acredite ser fácil ou que já conheça, pode seguramente subir sozinho.
Contudo, se estiver em caminho que for mais audacioso, necessariamente terá de contar com a colaboração de outros. Subir uma montanha participando de um pequeno grupo é o que as regras de montanismo recomendam. 
 

Nas obras de apostolado, e mesmo em atividades de ascese, é recomendável a colaboração mútua. Não há crescimento sem auxílio.
Vemos com tristeza muitos – congregados ou não – terem iniciativas, de priori boas, mas que necessariamente devem contar com a ajuda e participação de outros. É uma das leis da vida.
Entretanto, talvez por imaturidade ou vaidade, querem fazer tudo sozinhos. Como o montanista que se aventura por uma nova escarpa e somente conta consigo e com a própria sorte. Se conseguir muito bem, se não, ninguém o saberá, pois terá caído no abismo e talvez levarão muito tempo até encontrar seu corpo inerte no meio das pedras... Aconteceu1 com s. João Crisóstomo. Jovem, entusiasmado pela vida dos monges da época que eram eremitas no deserto, saiu da cidade para ficar no deserto, procurando na solidão a conversa mais pura com Deus. Devido a vários problemas, ficou um certo tempo imobilizado nas pernas e assim teria ficado até a morte se outro eremita não o tivesse visto e ajudado. Entendeu então que a vida em comunidade, mesmo para os monges, tinha o seu valor.
Deus não deseja uma solidão total. O cristianismo é uma religião de companhia. O próprio termo “igreja” – do grego ecclésia = comunidade – demonstra muito bem este auxílio mútuo, tanto em ajuda prática quanto em orações. O que rezamos no Credo – e prometemos, afinal, dizemos “eu creio” – é “Creio...na comunhão dos santos”.
Esta comunhão, em nível primeiramente espiritual, unido às três Igrejas - a militante, a padecente e a triunfante - faz com que nossas orações e boas obras sirvam para amenizar as penas de nossos irmãos no Purgatório, a Igreja Padecente. Serve também para que os santos – também nossos irmãos – intercedam por nós perante a Trindade Beatíssima, a Igreja Triunfante. Serve para que nos unamos aqui, nesta Terra, em orações e súplicas, pedindo a Deus uns pelos outros, a Igreja Militante.
Se nossa Fé nos ensina que existe esta reciprocidade de intenções, orações, pedidos, como podemos achar que teremos algum sucesso em nossas iniciativas sem a ajuda de outros ?
A própria Congregação Mariana nos mostra isso. Temos uma diretoria formada por pares. Diretoria essa que se renova periodicamente, como forma de demonstrar que não somos mais do que outros, somos todos consagrados – separados, escolhidos para – a Mãe de Deus. O “grande Presidente” na verdade é apenas o responsável por um período na vida daquela Congregação que, no caso de muitas, tem mais de um século de existência,graças a Deus.
Assemelha-se àquele atleta que passa o bastão para outro em uma corrida. E é assim que um Presidente de Congregação Mariana deve ver-se: como alguém necessário para a associação naquele momento da sua história. Como na corrida de bastões, existe um atleta para cada momento da prova – um perito em arrancada, um velocista, outro bom em curvas, etc – cabe a cada congregado analisar intimamente e verificar se, naquele momento da vida da sua Congregação, não será justamente ele que poderá melhorar a situação. E, conforme o espírito de comunidade – ou equipe – se não for ele o “cabeça”, com certeza será um dos membros que agirão.
Conforme o sentido marcial que é uma das características das Congregações Marianas, não se pode admitir o “passar por cima”, a iniciativa particular irresponsável, isto é, a iniciativa sem comunicação à cadeia de comando. Deve o congregado partilhar suas intenções, angústias junto à Congregação. Deve procurar convencer aos demais sobre tal ou tal situação que, a seu ver é alarmante e perigosa. Isso tem uma dupla função: fazer que nós vejamos com outros olhos algo que talvez seja apenas uma pequena preocupação nossa, algo de menor importância. Demonstrando a outros nossas preocupações estamos sujeitos a análise imparcial de outrem. Ele talvez veja aquilo que não vemos. Por outro lado, podemos ser o vigia que avisa aos demais soldados de um perigo iminente. Como no exército, sempre há postos separados para proteger a fortaleza. Todos são responsáveis uns pelos outros.
Contudo, há superiores que não fazem caso de tal ou tal alarme. Culpamos a eles pelo mau andamento de nossa associação. Mas também temos de ver em tudo a Providência de Deus. A Congregação é de Maria, não nossa. Cabe a Ela gerir sua agremiação. Somos colaboradores.
O próprio Santo Padre nos indica como devemos olhar nossas obras na Congregação Mariana:
uma Igreja que busca sobretudo ser atrativa já estaria em um caminho equivocado. Porque a Igreja não trabalha para si, não trabalha para aumentar os próprios números, o próprio poder. A Igreja está ao serviço de Outro, não está a serviço de si própria, não está para ser um corpo forte, mas para tornar acessível o anúncio de Jesus Cristo, as grandes verdades, as grandes forças de amor e de reconciliação, que apareceram nesta figura e que vêm sempre da presença de Jesus Cristo. A Igreja não busca ser atrativa, mas deve ser transparente para que Jesus Cristo apareça."2

Pode ser isto uma forma transcendente de ver a vida. Mas não é justamente para isso que somos congregados ?
Senão vejamos: percebe-se que muitos que agem humanamente nas Congregações não passam muito tempo nelas. Assemelham-se à videira3 que não dá frutos. O Divino Dono da Messe dá tempo para que a planta frutifique. E este tempo é restrito. Passado este tempo, e sem fruto, há o corte. Pior. As Congregações Marianas são “celeiros de vocações”. Há as que não “dão fruto”, seja em vocações, trabalhos ou piedade. Em pouco tempo, ela se acaba. Como a figueira4 estéril. Já vimos isso, não ?
Portanto, ajamos de uma forma coletiva. Com iniciativa pessoal, mas de ação coletiva. Teremos mais sucesso em todas as nossas empreitadas. Trabalharemos menos – quem desejaria construir uma laje sozinho? - e teremos também uma visão mais ampla de tal assunto, pois “duas cabeças pensam melhor do que uma”, como diz o ditado. Não seremos acossados por uma vaidade tola, que diz que “vi, vi e venci”5 mas “colaborei nesta obra”, sou “outro tijolo na parede”... Convenhamos, uma parede furada, sem um tijolo, é deprimente...  
Que a Virgem Senhora, participante da Redenção, nos ensine a agir como Ela mesma6 em Caná. Com iniciativa pessoal, soube agir para que Aquele que deveria agir assim o fizesse. Graças a Ela que temos o primeiro milagre do Redentor. Ambos foram glorificados. Ela, por agir de forma correta. Ele por manifestar, ainda que prematuramente, sua Presença.
Ò Virgem Prudentíssima, ensinai-nos !



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1- João Crisóstomo, ed. Quadrante
2- SS. Bento XVI, entrevista no vôo da Viagem Apostólica a Edimburgo, Grã-Bretanha, 16 de setembro de 2010
3- Lc 13,6-9
4- Mt 21, 18-19
5- vini, vidi, vinci – palavras atribuídas ao Imperador romano Júlio César
6- Jo 2,1-11

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