A Assistência do Diretor
Alexandre Martins, cm.
Sempre
foi tradicional nas Congregações Marianas a presença ostensiva de
um sacerdote.
Desde
a fundação da primeira Congregação Mariana, a presença de um
sacerdote foi algo característico destas associações. A própria
fundação, embora fosse um desejo piedoso dos jovens estudantes do
antigo Colégio Romano, também era um sonho do padre Leunis.
Desde o princípio
Na
Sociedade da época, ainda espantada com as mudanças do Concílio de
Trento, via também uma novidade igualmente incrível: o Sacerdote
era dedicado à associação. Havia até mesmo visitas do padre às
casas dos Congregados para um auxílio espiritual mais pessoal.
A
presença do sacerdote nas reuniões era mais do que nas Santas
Missas das Comunhões Gerais. Após as celebrações, haviam
palestras especiais para os Congregados em algum local do templo, de
uma forma que não era o estilo dos sermões habituais, mas de um
modo intimista e dedicado. Verdadeiras meditações inacianas.
Os
Congregados marianos se agrupavam em torno da figura do Sacerdote,
chamado de “Diretor da Congregação”. Mesmo com a partilha das
responsabilidades entre todos os Congregados, constituindo sua
Diretoria composta por leigos – outro avanço moderno feito pelas
Congregações Marianas na Igreja – a figura do Diretor sempre foi
intocada e característica.
Essa
característica era tão marcante e definia a forma de uma
Congregação Mariana que algumas tinham até um certa
“classificação” pelo nome do seu Diretor. Como as chamadas
“Congregações do Padre Coster”. O jesuíta Francis Coster* foi
um dos superiores da Companhia de Jesus que deu determinadas formas
às Congregações Marianas de sua época, alguma em uso até os dias
de hoje.
Até
mesmo no século XX há o exemplo da Congregação Mariana de Munique
(Alemanha) sob a Direção Espiritual do bem-aventurado Rupert Mayer** cuja história pode ser dividida como “antes do padre
Meyer” e em “depois do padre Meyer”.
Uma Característica das Congregações
As
Congregações Marianas foram criadas como um grupo ao redor de um
padre. Era costume pastoral dos jesuítas agruparem em torno de si
pessoas às quais pudessem proporcionar uma orientação espiritual
mais profunda. Desde os primeiros companheiros de s. Inácio de
Loyola, como Pedro Fabro, todos possuíam um pequeno grupo de
devotos1
que os seguiam fielmente e praticavam com dedicação suas
orientações.
Nosso
fundador, o pe. Jean Leunis, aprendeu essa prática desde cedo e foi
natural que a colocasse em prática na escola onde lecionava. Assim
surgiu a primeira Congregação Mariana: um grupo de devotos ao redor
de um piedoso sacerdote.
Essa
fórmula simples e eficaz permaneceu por muitos séculos e seu
abandono foi o princípio do fim de muitas Congregações Marianas.
Não
se concebe uma Congregação Mariana sem a presença constante e
dedicada de um sacerdote.
Os tempos do Concílio
Essa
presença dos sacerdotes nas Congregações Marianas persistiu até
após o Concílio Vaticano II, mais especificamente até a mudança
das Regras Comuns de 1910 - feitas pelo então superior geral da
Companhia de Jesus, Francisco Xavier Wernz – pelos Princípios
Gerais, compostas por leigos e por jesuítas.
A
partir da promulgação dos Princípios Gerais em 1967, a presença
do Diretor da Congregação foi quase anulada, sendo as novas
associações dirigidas e orientadas quase exclusivamente por leigos.
Era um momento singular, onde as preocupações sociais estavam na
moda e acreditava-se que, se “apenas uma pessoa poderia mudar o
mundo”, então um grupo poderia muito mais. E essa pessoa não
poderia ser um sacerdote, no pensamento da época.
O abandono dos sacerdotes
O
resultado prático foi que os sacerdotes ou deixaram as Congregações
Marianas nas mãos dos leigos ou os Congregados deixaram de pedir seu
auxílio. Com o passar do tempo, a presença dos sacerdote ficou
restrita às cerimônias de admissão.
No
Brasil, acostumado a uma presença quase totalitária do sacerdote,
ficou sem assistência espiritual de uma hora para outra. Os párocos
deixaram as Congregações Marianas nas mãos dos então bem
preparados Congregados que, contudo, não conseguiram formar seus
sucessores adequadamente justamente por falta do Padre Diretor em seu
auxílio. OS bispos seguiram o mesmo que os párocos e, com as
mudanças no Episcopado e o distanciamento das Congregações
Marianas, foram pouco a pouco esquecendo delas até a chegar a um
quase total desconhecimento.
Uma nova esperança
Esse
cenário foi piorando a partir dos anos 1970 até os anos 1990, por
ocasião da Regra de Vida brasileira. De repente, um bispo jesuíta,
D. José Carlos de Lima Vaz, toma para si a tarefa de atualizar as
Congregações Marianas do Brasil e é seguido por Congregados
marianos idosos que acreditavam que os bons tempos retornavam. Foram
também acompanhados de Congregados que não sabiam o que estava
realmente acontecendo, pois nunca tinham visto um Bispo tão perto
das Congregações Marianas.
A
resposta foi muito boa para a época: novas Congregações Marianas
foram fundadas, algumas antigas reabertas, novos padres sendo
presenteados com a fita azul, etc.
Mas
o problema crucial não foi solucionado: as Congregações Marianas
não tiveram o retorno do sacerdote à cadeira do Diretor Espiritual.
A Regra de Vida e as confusões
A
Regra de Vida de 1994 só fez solidificar a distância do sacerdote
em relação à Congregação Mariana. Para piorar as coisas, quase
ninguém entendeu o termo “Congregado emérito”.2
O que foi pensado por D. Vaz como uma forma de acomodar os sacerdotes
que não tinham tempo para frequentar as Congregações Marianas,
tronou-se algo do tipo “prêmio” dado a qualquer sacerdote ou
bispo que fosse “amigo dos Congregados”.
O
resultado final foi mais do mesmo: os sacerdotes continuaram
afastados da direção espiritual das Congregações Marianas, agora
com a justificativa de serem “eméritos”.
Com
a proliferação de atividades paroquiais, o pároco tende a ser
exigido por todos e em demasia. Cabe a ele compreender que uma
Congregação Mariana exige bastante de um sacerdote, não por outro
motivo senão por ser característica da atividade da associação.
Poucas associações católicas levam tão a sério a vida espiritual
a ponto da presença do sacerdote ser tão necessária. Se um pároco
não pode proporcionar a uma Congregação Mariana a atenção que
ela precisa ter, então é melhor que nem a tenha em sua paróquia.
Ou então que a deixe sob a tutela de outro sacerdote.
Razões
humanas podem fazer com que um padre relute em permitir a outro
sacerdote a direção espiritual da Congregação Mariana de sua
Paróquia. Ma a Regra de Vida prevê que a assistência espiritual de
uma Congregação Mariana pode ser entregue até mesmo a religiosos
ou diáconos. Pensando bem, uma paróquia extensa que possua várias
capelas em seu território com uma Congregação Mariana em cada uma
é humanamente impossível ao pároco acompanhá-las como deve ser. É
iniciativa do pároco deixar que alguém possa fazer o trabalho do
Diretor Espiritual mesmo que subordinado a ele próprio.
Leigo como Diretor Espiritual?
A
Regra de Vida sugere que até mesmo um leigo3
bem preparado possa ocupar a cadeira do Diretor Espiritual ou mesmo
ser seu substituto. A experiência nos mostra que isso não dá
certo, além de ser completamente desastroso.
O
múnus sacerdotal inclui o ensino da Verdade4
e o laicato não possui essa bênção. Basta aos leigos o cargo de
Instrutor da Congregação, o que não é pouca coisa. A Direção
Espiritual de uma Congregação Mariana deve obrigatoriamente5
ser entregue a um sacerdote. Isso faz parte de nossa tradição.
É
uma das três condições básicas6
para a fundação de uma Congregação Mariana – a saber, 1)número
de pessoas; 2)capacidade do ambiente; 3)sacerdote responsável. A
falta de apenas uma dessas condições não permite a existência de
uma Congregação Mariana.
Como deve o sacerdote agir?
A
forma da assistência espiritual dada pelo sacerdote à sua
Congregação Mariana não possui regra definida. O princípio é o
da amorosa paternidade espiritual.
Cada
sacerdote sabe de suas dificuldades de tempo para atender aos seus
fiéis, mas se ele tiver a consciência de sua importância vital
para a vida interior dos Congregados conseguira tempo extra que sera
multiplicado na atuação eficaz dos apóstolos leigos que formara a
partir da Congregação Mariana.
Os
antigos Manuais de Congregado7
citavam uma atividade mensal chamada “Consulta”, Tratava-se de
uma reunião, em geral da Diretoria com o padre, onde este dirigia
todo o andamento da Congregação Mariana e ao qual eram dirigidas
perguntas para a melhoria da associação e também sobre a vida
espiritual dos Congregados. Daí nomear-se essas reuniões especiais
de “Consultas ao Padre Diretor”.
Há
sacerdotes que preferem participar por alguns minutos da Reunião
Geral dos Congregados, ouvindo os problemas das Congregação Mariana
e apresentando soluções. Como foi citado acima, não há forma
definida para a assistência do padre.
O Instrutor, subordinado ao Assistente
O
cargo de Instrutor, seja qual for a intensidade da assistência do
sacerdote, é um cargo8
imediatamente subordinado a ele. Tudo o que o Instrutor (e seus
auxiliares) fizerem deve estar avaliado pelo sacerdote. Não há
nenhum Programa de Instrução que seja composto pelos Congregados
sem ser avaliado cuidadosamente e aprovado pelo sacerdote.
Uma Direção Espiritual comunitária
Um
fato de que pouquíssimos pessoas atentam é que os problemas de uma
Congregação Mariana surgem quando da ausência do sacerdote. É
justamente a partir da falta da presença orientadora do padre que
todos os problemas espirituais aparecem e tomam um tamanho que
culminará com o fim da Congregação Mariana e, pior, com a perca da
Fé de alguns Congregados.
Não
é exagero afirmar que o Consagrado a Maria, e mesmo aquele que esta
em preparação pra tal, é tentado pelos inimigos9
de nossa alma. O apoio de um Diretor Espiritual, a docilidade a suas
orientações, e a recepção oportuna dos Sacramentos que somente
ele pode nos ministrar é assunto indiscutível na vida espiritual de
um cristão.
Ora,
se a direção espiritual é absolutamente necessária para o
progresso na Fé, e se uma Congregação Mariana é formada por
pessoas que são Consagrados a Maria e que, pelo mesmo fato, querem
progredir na mesma Fé, então se torna absolutamente necessária a
presença de um Diretor Espiritual.
Não
se compreende a exigência da Direção Espiritual particular e não
a Direção Espiritual comunitária em uma Congregação Mariana.
Seria
cansativo enumerar todos ou a maioria dos problemas que uma
Congregação Mariana e até mesmo cada um dos seus Congregados
sofreria sem a presença assídua de um Diretor espiritual. Basta
dizermos isto: é o principio do fim.
Nomenclatura
Há
os que debatem sobre o nome da dado à função do sacerdote na
Congregação Mariana., Uns querem o proposto desde a criação dos
Princípios Gerais - “Assistente Eclesiástico” - e outros não
querem a abrir mão do tradicional nome “Diretor Espiritual”.
A
nosso ver, cada nomenclatura tem uma intenção por detrás. O Assistente
provem da época conciliar, aonde se desejava deixar o leigo agir por
conta própria, dado a boa formação da maioria e o desenvolvimento
do apostolado dos leigos, O sacerdote seria apenas um “orientador”,
um “apoiador” de boas ideias.
A urgência de sacerdotes diretores
A
intenção do Diretor Espiritual, característico desde a primeira
Congregação Mariana, é a de um controle maior por parte do
sacerdote. Ele age como um real diretor espiritual, como se agisse
num confessionário, guiando almas, ou num ambão proclamando a
Palavra de Deus. Sua atuação é mais direta e os leigos o procuram
como filhos espirituais e como sábio conselheiro. Não se trata de
submissão , mas de docilidade aos seus conselhos.
A
função do sacerdote em uma Congregação Mariana é primordial,
característica e insubstituível. Não pode existir uma Congregação
Mariana sem a presença pastoral de um sacerdote. Aos padres deve
mover a consciência de sua grande responsabilidade na formação
espiritual desse exercito de guerreiros da Fé.
Que
a Virgem Maria, Rainha dos Sacerdotes, nos ampare, aos leigos e aos
sacerdotes.
___________________________________________________
(*) - Francis Coster (ou Frans de Costere, latim:
Franciscus Costerus), 16/6/1532 – 16/12/1619, jesuíta, teólogo e
autor. Frans de Costere foi recebido na Companhia de Jesus por
Santo Inácio em 7 de Novembro 1552. Enquanto ainda era jovem, ele
foi enviado para a Colônia (oeste da Alemanha) para uma palestra
sobre a Sagrada Escritura e astronomia. Sua reputação como
professor foi criada dentro de um curto espaço de tempo, e em 10 de
dezembro de 1564, a Universidade de Colônia conferiu-lhe o grau de
Doutor em Filosofia e Teologia. Ele estava sempre pronto para
defender o ensino da a Igreja Católica, que neste período estava
envolvido na luta com protestantes, e pela palavra e por escrito, ele
trouxe as pessoas de volta ao catolicismo. Foi por dois mandatos
Provincial da província jesuíta da Bélgica, Provincial no Reno, e
assistiu a três Congregações Geral da Ordem.
(**) - Rupert Mayer (23/1/1876 – 1/11/1945) alemão,
padre jesuíta e um dos líderes da resistência católica ao nazismo
em Munique. Rupert terminou o ensino médio em 1894 e estudou
filosofia e teologia em Friburgo, na Suíça; Munique e Tübingen. Em
1899, foi ordenado e ingressou na Companhia de Jesus Áustria (então
Áustria-Hungria) em 1900. Desde 1914, o P. Mayer foi capelão
voluntários no Primeira Guerra Mundial. Em 1915 o P. Mayer foi o
primeiro capelão para ganhar a Cruz de Ferro por bravura em
reconhecimento do seu trabalho com os soldados na frente. A partir de
1921 líder da Congregação Mariana, em Munique. Rupert Mayer morreu
de um acidente vascular cerebral, enquanto ele estava celebrando a
Missa da festa de Dia de Todos os Santos. “O Senhor, o Senhor, o
Senhor.”, foram suas últimas palavras.Em 1956, o Papa Pio XII, que
havia conhecido pessoalmente o Pe Rupert Mayer durante seu tempo como
núncio em Munique, concedeu-lhe o título de Serva de Deus. De
acordo com o Papa João XXIII, o processo de beatificação foi
iniciado, cujos resultados foram formalmente aceite pelo Papa Paulo
VI em 1971. De acordo com o Papa João Paulo II, o decreto de
"virtudes heróicas" foi emitido em 1983. Pe Rupert Mayer
foi beatificado pelo Papa João Paulo II em 03 de maio de 1987, em
Munique.
1- LEITE, Pe. Serafim. História da Companhia de Jesus no Brasil. 10 vols.: Lisboa/Rio de Janeiro, Livraria Portugália/Civilização Brasileira, 1938-1950.
2-
Regra 52:
São considerados eméritos os Congregados Marianos que, pela
idade, condições de saúde ou outro motivo relevante, ou porque
emitiram a Profissão Religiosa, já não podem mais participar das
atividades normais da vida da Congregação Mariana. São também
Eméritos os Congregados Marianos que deixam o estado laical ao
receberem as Ordens Sacras.
3-
...excepcionalmente
de um diácono, religioso ou religiosa, e mesmo de um leigo que
conheça bem a vida e a espiritualidade da Congregação Mariana.
(Regra 41) Ele não terá o título de Assistente Eclesiástico,
embora atenda, no todo ou em parte, às funções deste. (Regra 65)
4-
o
munus
docendi,
ou seja, aquele de ensinar
(conf. Catequese do Papa sobre ministério sacerdotal , 14/4/2010)
5-
O Assistente Eclesiástico, de livre designação do Bispo Diocesano
ou seu delegado, deve ser um Sacerdote (CDC, cânon 564) que
acompanhará a vida da Congregação Mariana. (Regra 65)
6-
Manual Devocionário do Congregado Mariano, edição oficial da
CNCMB, pág. 82, Edições Loyola, SP, 1981
7-
Manual dos Congregados, pág. 35, edição oficial da CNCMB, 1947.
8-
O Instrutor deve
ser escolhido entre os Congregados com capacidade para orientar e
acompanhar os Aspirantes e Candidatos, em íntima união com o
Assistente Eclesiástico. (Regra 63)
9-
O Mundo, O Demônio e a Carne.
“A Igreja
Militante é a Sociedade de todos os fiéis que ainda vivem na
terra. Chama-se militante porque está obrigada a manter uma guerra
incessante contra os mais cruéis inimigos: o mundo, a carne e o
Diabo” -
Catecismo do Concílio de Trento