Quando eu não puder mais estar na Congregação
Recepção de novos Congregados - CM de Miami (EUA) 2010 |
Alexandre Martins, cm.
Um famoso samba, imortalizado pela interpretação da cantora
Alcione, é cantada quase como um hino ao samba carioca e repetido à
exaustão em todas as rodas de samba e por todos aqueles que entendem
de música brasileira.
É a música “Não Deixe o Samba Morrer”. Eis a letra:
Não Deixe o Samba Morrer1
Quando eu não puder
Pisar mais na avenida
Quando as minhas pernas
Não puderem aguentar
Levar meu corpo
Junto com meu samba
O meu anel de bamba
Entrego a quem mereça usar
Eu vou ficar
No meio do povo espiando
Minha Escola perdendo ou ganhando
Mais um carnaval
Antes de me despedir
Deixo ao sambista mais novo
O meu pedido final
Antes de me despedir
Deixo ao sambista mais novo
O meu pedido final
Não deixe o samba morrer
Não deixe o samba acabar
O morro foi feito de samba
De Samba, pra gente sambar
Essa pérola
do samba pode servir para uma meditação sobre o nosso futuro na
Congregação Mariana.
Usar de um samba para meditação? Sim, pois nos mostra o Apóstolo
quando nos indica examinar a tudo e tirar o bem disso.2
E também Santo Inácio de Loyola: “Encontrar Deus em todas as
coisas e ver que todas as coisas vem do alto” pois “o
Homem é criado para louvar, prestar reverência e servir a Deus
nosso Senhor e, mediante isto, salvar a sua alma; e as outras coisas
sobre a face da terra são criadas para o homem, para que o ajudem a
conseguir o fim para que é criado. Donde se segue que o homem tanto
há de usar delas quanto o ajudam para o seu fim”.3
Então, como herdeiros de Santo Inácio, vamos analisando e
comparando...
Quando eu não puder / Pisar mais na avenida...
Não sabemos quando não poderemos mais estar na Congregação
Mariana. Físicamente, digo, pois estaremos sempre inscritos nela.
Teremos nosso nome escrito por nós mesmos no seu Livro de
Consagrações.
A “não estar mais” não me refiro aos que desistiram de suas
promessas, aos que abandonaram o caminho da Fé, mas sim àqueles
que, como sementes que caíram em meio aos espinhos, ficaram
sufocados pelos problemas do Mundo e cruzes da vida.
Algum dia, talvez, não poderemos mais estar na Congregação. E para
isso devemos nos acautelar.
Quando as minhas pernas / Não puderem aguentar...
Doenças, compromissos com a família, um trabalho extenuante ou tão
intenso que nos leve para longe... Tudo então nos “enfraquece as
pernas”. O que decidiremos? Abandonar a Congregação ou arrumar
uma forma de estar sempre em contato? Cabe a cada um de nós escolher
com justiça.
Levar meu corpo / Junto com meu samba...
Não poderemos mais estar tão
ativos quanto antes. É hora de pararmos com tudo? Acaso se eu não
puder mais ser um dos diretores, por absoluta falta de tempo
disponível ou por cansaço mental, então em nada mais poderei estar
no convívio com meus irmãos na Congregação? Quantos congregados
quiseram simplesmente ocupar uma das cadeiras da sala de reuniões e
rezar o Ofício da Imaculada junto com seus irmãos perante o altar
da Virgem!
O sambista quer “levar seu corpo e
com ele o seu próprio samba”. Quer demonstrar seus passos bonitos
para que os outros gostem de sua música. O Congregado quer estar nos
ambientes para que os demais possam vislumbrar uma verdadeira devoção
mariana e assim, talvez, se sentirem tocados a mudarem de vida e
serem mais marianos. Ele ostenta sua fita azul não por vaidade mas
para que outros vejam um excelente caminho de santidade pessoal que
trilha e deseja que mais trilhem também. Pois como diz o Papa
Pio XI, os Congregados marianos são “leigos
que, como anciãos, servem de exemplo aos jovens e lhes ensinam como
devem cumprir seus deveres civis e religiosos”.4
O meu anel de bamba / Entrego a quem mereça usar...
Na música o velho sambista entrega seu próprio símbolo de
distinção ao melhor músico da comunidade. Os Congregados recebem
na Congregação Mariana apenas os que se destacam na piedade e
testemunho pessoal na sociedade. Os nomes dos pretendentes passa por
um crivo dos mais antigos, dos diretores e até do sacerdote local.
Não é favoritismo ou criação de uma espécie de classe
socio-eclesial, mas não dar “pérolas aos porcos” (Mt 7,6). A
Consagração à Virgem Maria na Congregação é algo que só pode
ser permitido aos que se destacam perante os demais. Somente os que
demonstram saber o real valor desse maravilhoso ato é que podem ser
admitidos na “grei santa”. O papa São Pio X animava ao mirar os
Congregados: “me parece ver em vós as porção escolhida dos
verdadeiros cristãos; cristãos fervorosos, dispostos a qualquer
sacrifício, com a proteção da Virgem e sobre o amparo da divina
Onipotência.”5
Eu vou ficar / No meio do povo espiando / Minha Escola perdendo ou ganhando / Mais um carnaval...
Os Congregados marianos nunca deixam de estar na Igreja,
participando, observando, unidos à Barca de Pedro, em todos os
momentos, sejam eles bons ou ruins. Os Congregados não são aqueles
que ficam enquanto está um bom tempo mas são os amigos que ficam
conosco até no meio da chuva. Os bons sacerdotes sabem disso e
contam com eles, mesmo idosos, que não se omitem em ajudar nem ao
menos se for para acender as velas da capela...
Antes de me despedir / Deixo ao sambista mais novo / O meu pedido final...
As crianças sempre estiveram nas Congregações Marianas desde a
primeira Congregação em Roma. Na época, eram os filhos dos
primeiros Congregados. Hoje, são crianças que se aproximam após a
sua Primeira Comunhão ou por recomendação dos seus pais, admirados
pelo estilo de vida dos Congregados. Na tradição brasileira,
possuem o nome de “marianinhos”.
Os Congregados se preocupam em passar para as gerações mais novas o
legado que possuem e que receberam dos antigos. Por isso se admitem
crianças aos grupos da Congregação, uma tradição que foi
elogiada pelos papas e se tornou uma finalidade delas: “instruir a
juventude nos bons-costumes e nas letras.” 6
Não deixe o samba morrer / Não deixe o samba acabar...
Nosso “samba” é a devoção à Virgem Maria. O Congregado é o
vassalo de Maria, alguém que está sempre disposto a servi-La, a
seguir a Cristo por sua imitação, a ajudar a Igreja como Ela esteve
junto dos Santos Apóstolos.
É essa a mensagem que passamos para as novas gerações e que
diariamente nos lembramos para fazer: não deixar morrer nos corações
o amor à Virgem Maria e a sua perfeita imitação. É finalidade
das Congregações Marianas “propagar por todo o mundo a
integridade e a santidade da fé e unidade católicas, a doutrina e
piedade cristãs, juntamente com o Nome Divino e o da Santíssima
Virgem Maria.” 7
O morro foi feito de samba / De Samba, pra gente sambar...
As Congregações Marianas são feitas da pura devoção marial. É
essa a base de sua existência. Sem essa devoção a Mãe de Deus,
seremos apenas mais um grupo de católicos ou, pior, apenas um grupo
de pessoas que se reunem para “algo bom”.
A devoção marial na Congregação Mariana é seu sentido, sua
motriz, seu desenvolvimento, sua força e sua promoção. Sem ela,
não existe uma Congregação.
Uma Congregação Mariana não é simplesmente filantropia, não é
grupo de amigos, não é fuga do mundo, não é suporte para párocos,
não é escola de catequese. Uma Congregação Mariana é o
desdobramento de uma vida de consagração à Virgem Maria e, como
tal, necessariamente é apostólica e intensamente espiritual.
Conclusão
Quando escutarmos esse samba, criado nos bons tempos da música
brasileira, lembremos que nunca devemos nos afastar da Congregação
Mariana. E se, fisicamente não pudermos mais “estar na
Congregação”, acompanhemos de coração a ela, em oração,
suplicando a Deus que os novos Congregados não a deixem morrer.
Salve, Maria!
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1-
Samba composto por Edson Conceição e Aloísio Silva. Foi gravado
em 1975 pela cantora Alcione, que ganharia as paradas de sucesso no
início do ano seguinte com essa canção, faixa de seu primeiro
álbum de estúdio “A Voz do Samba”.
2-
“Discerni tudo e ficai com que é bom”. - Primeira Carta de S.
Paulo aos Tessalonicenses 5,21
3s.
Inácio de Loyola in “Livro dos Exercícios”, ponto 23
4-
- Discurso aos Congregados Húngaros - 25 de abril de 1925
5-
Discurso no Primeiro Congresso das Congregações Marianas da
Itália - 7 de setembro de 1904
6-
papa Pio VI, in Decreto de 20 de Março de 1776
7-
papa Bento XIV in Bula Áurea “Gloriosae Dominae” - 27 de
setembro de 1748